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Deputado do PL influencia governador do RJ a trocar secretário da Fazenda

GABRIEL VASCONCELLOS, Valor
A troca no comando da Fazenda do Rio, em momento decisivo da negociação com a União sobre o regime de recuperação fiscal, revela a dimensão da influência de um deputado estadual recém-chegado ao PL, Rodrigo Bacellar, no governo Claudio Castro (PL).

A troca no comando da Fazenda do Rio, em momento decisivo da negociação com a União sobre o regime de recuperação fiscal, revela a dimensão da influência de um deputado estadual recém-chegado ao PL, Rodrigo Bacellar, no governo Claudio Castro (PL).

O Valor apurou que Bacellar, político do norte fluminense com trajetória meteórica, articulou a substituição do experiente contador Nelson Rocha, que chefiava a pasta, pelo economista Leonardo Lobo, um servidor de carreira da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) com passagem recente pelas Fazendas de Rio e Goiás.

A informação foi confirmada por fontes graduadas do governo e da Assembleia Legislativa (Alerj). A troca teria sido motivada pela abertura de espaço para indicações políticas na administração fazendária e por atritos entre a Fazenda e grupos econômicos ligados a Bacellar, em especial do setor de combustíveis. Haveria divergências com relação a incentivos fiscais e ações de fiscalização e controle que avançaram dentro da secretaria sob Rocha. Agora à frente da secretaria de Planejamento, Rocha era simpático a aumentar o rigor do fisco ao setor de combustíveis a fim de maximizar receita tributária. Procurado, Rocha não se pronunciou.

A troca de secretário, oficializada na noite de 4 de abril, vem dias antes de uma audiência de conciliação entre Estado e União marcada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir a aprovação final do RRF. O acordo sobre o relaxamento temporário do pagamento da dívida de 184 bilhões do Rio com a União segue travado na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que vê inconsistências como a manutenção do triênio, adicional por tempo de serviço aos servidores. omo Rocha era artífice do RRF, a mudança causou estranhamento entre deputados e na própria Fazenda. Além de avanços no plano, houve aumento de receita de 37,2% nas receitas estaduais em 2021, com estabilidade de despesas e redução de gasto com pessoal.

Procurado, Bacellar não respondeu às perguntas do Valor. Advogado em primeiro mandato na Alerj, ele tem reduto eleitoral em Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, onde rivaliza com o grupo político de Anthony Garotinho (União Brasil), a quem têm fechado as portas do Palácio Guanabara. O ex-governador buscava se aproximar de Castro para compor aliança nas eleições em troca de participação no governo.

Bacellar foi eleito em 2018 com votação modesta, 26 mil votos, e só ganhou notoriedade ao ser relator do processo de impeachment do ex-governador Wilson Witzel. Foi quando se aproximou de Castro, o principal beneficiário da cassação de seu ex-cabeça de chapa. Com a posse definitiva de Castro, o deputado ascendeu rapidamente e foi nomeado para chefiar a secretaria de Governo em maio de 2021, cargo que deixou na semana passada para tentar a reeleição esse ano.

Na pasta, Bacellar tocou programas de grande evidência, como o Segurança Presente, levado para outras cidades para além da capital, e cuidou da interlocução do governo com parlamentares, impondo derrotas ao presidente da Alerj, André Ceciliano (PT). O desempenho, dizem colegas, o habilita a disputar a presidência da Casa, articulação que seria facilitada com o apoio de Castro, se reeleito.

Sobre a última prova de força de Bacellar, a troca na Fazenda, um episódio é comentado nos bastidores: o avanço do cerco à usina de etanol Canabrava, de Campos dos Goytacazes, sua cidade natal. A usina é denunciada pelo Ministério Público do Estado por irregularidades na utilização de benefícios fiscais e sonegação de impostos, pelo que o órgão pede a restituição de R$ 430 milhões ao erário estadual.

Segundo procuradores do MPRJ e auditores fiscais do Estado, a usina comprava combustível de produtores paulistas e revendia às distribuidoras no Rio como se tivesse fabricado no estado. Assim, tirava proveito da alíquota especial de 3% exclusiva para o etanol produzido localmente, uma vantagem concedida ainda em 2012 no governo Sérgio Cabral. A tarifa cheia sobre o produto, sem incentivos, é de 32%. O Valor procurou a Canabrava, mas não conseguiu contato.

Após as ações do MPRJ, a Fazenda suspendeu, pela segunda vez em menos de um ano, a inscrição estadual da Canabrava, impedindo-a de comercializar álcool combustível. Em paralelo, corre, dentro da secretaria, processo administrativo para cassar em definitivo os incentivos fiscais à usina. Em fase final, o processo ainda não foi concluído. E, ainda que fontes com conhecimento do assunto afirmem não haver mais espaço para reverter a medida, mudanças no comando da Fazenda Estadual podem travá-la. Como são poucas as usinas “produtoras” de etanol no Estado, eventual volta da Canabrava ao mercado com a alíquota de ICMS cheia alteraria não só suas margens de lucro como a de outros atores da cadeia de combustível no Estado.

A primeira investida da Fazenda do Rio contra a inscrição da Canabrava ocorreu em maio de 2021 e, como agora, coincidiu com a troca do então secretário Guilherme Mercês por Rocha. Dois meses, depois, em julho de 2021, Rocha editou resolução que permitia a empresas alvo de processos de cassação de inscrição voltarem a realizar transações. A medida era geral, mas beneficiou diretamente a usina de Campos. À época, Bacellar, já secretário de Governo, foi um dos articuladores da solução, abraçada por Castro. Em agosto, com a Canabrava já de volta ao mercado, Castro chegou a visitar à cidade, sendo homenageado por empregados da usina, que também mencionavam Bacellar.

O governo do Rio informou que a troca tem “apenas razões técnicas” e que Rocha foi para o Planejamento para substituir Jose Luís Zamith, que saiu para a iniciativa privada. A ideia seria manter a integração entre as pastas e garantir respeito ao RRF em orçamentos futuros.
Há, também, o argumento de que Lobo, o novo ocupante da Fazenda, também pode contribuir com as negociações em Brasília, por ser servidor do Tesouro.

https://valor.globo.com/politica/noticia/2022/04/11/no-rio-deputado-mexe-na-fazenda.ghtml

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