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Refinaria de Manguinhos: Cade arquiva investigação contra empresa (CONTEÚDO COMPLETO)

GUILHERME PIMENTA, Jota
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica arquivou uma investigação contra a Refinaria de Manguinhos, atualmente denominada Refit, e as distribuidoras Rodopreto, 76 Oil, e Minuano por supostas práticas anticompetitivas causadas a concorrentes com a sonegação de impostos.

O processo já havia sido arquivado pela Superintendência-Geral (SG) no fim de dezembro, mas houve uma tentativa de avocação ao Tribunal pelo conselheiro Luis Braido, que foi negada por maioria (4 x 3).

O processo foi aberto no órgão antitruste após uma representação da Associação Brasileira de Combate às Fraudes de Combustíveis (ABCFC) contra a Rodopreto. Posteriormente, a a Raízen solicitou ao Cade para se juntar à ABCFC no processo, apresentando também uma denúncia contra a 76 Oil, Minuano e Refinaria de Petróleo de Manguinhos.

Na denúncia, a Raízen defendeu que o caso não se trata do ilícito de preços predatórios em sua acepção clássica, mas que o Cade deveria analisar se os custos das empresas representadas não ficam significativamente menores quando comparados com os preços das distribuidoras concorrentes, justamente em virtude do não pagamento reiterado de tributos, o que causaria impactos anticompetitivos no setor.

A Refinaria de Manguinhos, por exemplo, chegou a ter sua inscrição estadual em São Paulo cassada. Ela foi classificada pelo Estado como devedora contumaz de impostos. Ela e as demais empresas negam as irregularidades apontadas.

m agosto do ano passado, a Superintendência-Geral do Cade concluiu não haver efeitos anticoncorrenciais nas práticas denunciadas e arquivou o inquérito. Entre as justificativas apresentadas pela SG, nenhuma das empresas detem poder de mercado, mantendo-se abaixo de 20% de participação, o que impediria o sucesso em uma estratégia de sonegação de impostos para prejudicar concorrentes.

Os técnicos do Cade ponderaram que “está claro, por exemplo, que práticas que visem deliberadamente retardar o recolhimento de impostos ou, mais graves, práticas de sonegação fiscal, causam prejuízos à sociedade”.

“Importante, neste sentido, este Cade dar conhecimento às autoridades competentes deste Inquéritos Administrativos, visando dar-lhes um melhor conhecimento deste mercado e das demandas que chegam a este Conselho”, assinala a nota técnica, assinada por Patricia Sakowski, superintendente-geral substituta, Cristiane Landerdahl de Albuquerque, coordenadora-geral e Alessandro Guimarães Pereira, analista em Ciência e Tecnologia.

Apesar disso, segundo os técnicos do órgão antitruste, não é competência do Cade mediar conflitos de natureza tributária.

“A presente análise não encontrou, pelo conhecimento dos fatos por esta SG e sob o ponto de vista da análise antitruste, nexo de causalidade entre a atuação das representadas e algum dano ao ambiente concorrencial, mesmo que potencial. Não se comprovou, enfim, a prática de condutas, seja semelhantes a sham litigation ou preços predatórios ou, ainda, de outra natureza, como condutas coordenadas, abarcadas pela Lei 12.529/2011 que permitam concluir por dano sensível ao ambiente concorrencial no período avaliado”, defendeu a SG.

Pedido de avocação

Em sessão extraordinária realizada em 20 de janeiro deste ano, o conselheiro Luis Braido apresentou seu despacho pela avocação do processo.

No início de seu voto, o conselheiro disse que, a partir do momento em que solicitou a avocação do inquérito, as empresas representadas atuaram em duas frentes: tecnicamente e politicamente.

“Após o despacho, houve duas linhas de defesas empreendidas pelas empresas. Uma técnica profissional, com a apresentação de memorandos e audiências, e outra político-midiática, com notas na imprensa e atuação de bastidor sem elementos de interesse público”, relatou Braido.

O JOTA apurou que houve uma tentativa de pressão por parte de parlamentares da bancada do Rio de Janeiro a conselheiros do Cade para que a investigação contra Manguinhos e as demais empresas não fosse avocada pelo Tribunal e, logo, o arquivamento permanecesse mantido.

O Executivo também cobrou esclarecimentos do órgão antitruste sobre as apurações envolvendo a Refinaria de Manguinhos após ser questionado por políticos. Assessores diretos do ministro da Economia, Paulo Guedes, chegaram a telefonar para o relator para entender as investigações.

“Vou me ater à defesa técnica por não haver dúvidas na comunidade antitruste sobre a independência do Cade, o que já foi demonstrado em outras ocasiões”, rebateu o conselheiro Luis Braido durante a sessão.

No despacho, o conselheiro solicitou a continuação das investigações por parte da Superintendência-Geral, com foco, por exemplo, na busca de informações sobre quantidade e custo médio de aquisição e venda de etanol, custo médio mensal com tributos sobre a venda de etanol no Rio de Janeiro (ICMS, ICMS substituição, PIS/COFINS) e aprofundamento na discussão sobre o mercado relevante afetado pelas condutas investigadas.

“Ainda que o não pagamento de tributos constitua ilícito de natureza tributária e regulatória, as competências do Cade e das demais autoridades são complementares e não se confundem. A análise deste Conselho deve recair tão somente sobre eventuais efeitos anticompetitivos decorrentes da conduta investigada, em observância aos ditames legais de prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica”, defendeu o conselheiro.

A conselheira Paula Azevedo concordou com Braido e votou pelo andamento das investigações. Juntou-se a eles o conselheiro Luiz Hoffmann.

No entendimento da conselheira, a prática investigada neste caso, “consistente na alegada inadimplência fiscal reiterada, como verdadeiro modelo de negócios, configura-se como uma estratégia competitiva que deve ser analisada por este Conselho com a devida cautela, uma vez que tem o condão de gerar efeitos anticompetitivos severos e evidentes”.

Divergência
O conselheiro Mauricio Oscar Bandeira Maia abriu a divergência e votou pela não avocação do inquérito envolvendo Manguinhos e as demais empresas.

Segundo Maia, “embora se trate de tema relevante, que pode até ficar no radar desta autoridade da concorrência para eventuais investigações futuras, no caso concreto, considerando a inexistência de poder de mercado por parte das representadas, os possíveis danos à sociedade de condutas reiteradas de não recolhimento de impostos devem ser tratados nas esferas adequadas de decisão, não se vislumbrando, a princípio, competência da autoridade concorrencial”.

“Em outras palavras, temo que, ao avocar o presente Caso, o Cade esteja adentrando esferas que não são de sua competência, o que traria prejuízos e inseguranças ao mercado, sem perspectiva de utilidade da continuidade do processo nesta autarquia”, votou.

O conselheiro Sérgio Costa Ravagnani acompanhou Maurício no mérito, mas divergiu na argumentação. Para Ravagnani, o Cade possui, sim, competência legal para analisar práticas tributárias que possam produzir danos à concorrência, ainda que estes não sejam alcançados.

“O texto legal é expresso ao qualificar as infrações à ordem econômica sujeitas à apuração deste Conselho como os atos sob qualquer forma manifestados que tenham por objeto ou possam produzir efeitos nocivos à concorrência, independente de se a prática analisada guarda alguma relação com fatos disciplinados em outro regime jurídico, como a legislação tributária”, argumentou.

No caso concreto, entretanto, o conselheiro defendeu que “os elementos apurados na investigação não permitem afirmar que a medida de melhor racionalidade administrativa seja prosseguir com este inquérito”.

Esse entendimento foi acompanhado pelo presidente do Cade, Alexandre Barreto, e pela conselheira Lenisa Prado, que votaram contra a avocação, formando maioria.

Segundo Lenisa, a autarquia antitruste tem competência de investigar sonegações fiscais que prejudiquem a concorrência, ao lado das receitas e da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

“Porém, nesse momento, não vejo que existem indícios que sinalizem que estejamos defronte à alegada inadimplência tributária, tão significativa que impacte a própria formação do custo, sem que o próprio Fisco e a ANP tenham vislumbrado tal ilegalidade”, discordou a conselheira.

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